Profissionais casaram no Brasil e receberam permissão para permanecer no país. Eles afirmam que querem revalidar o diploma, mas estão preocupados com manutenção das suas famílias até finalização do processo.
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Três dos quatro médicos cubanos (à frente), que ficaram em Mossoró, receberam apoio de pacientes e amigos que fizeram na cidade — Foto: Sara Cardoso/Inter TV Costa Branca |
Quatro dos 14 médicos cubanos que atuavam através do Programa Mais
Médicos em Mossoró, na região Oeste, resolveram ficar no país, mas agora
enfrentam o desemprego. Eles chegaram na primeira leva de
profissionais, em 2014, e, de lá pra cá, se casaram com brasileiros. Com
a saída e Cuba do programa, receberam autorização para ficar, mas agora
enfrentam a dúvida: como vão sustentar suas famílias, já que o processo
de revalidação leva meses?
Um desses profissionais é o médico Yoanis Infante Rodriguez. Ele disse
que após se formar em Medicina, em Cuba, trabalhou no país natal e
passou outros dois anos em Caracas, na Venezuela, através de um programa
de cooperação entre os dois países, semelhante ao Mais Médicos. Depois
que chegou ao Brasil, se casou em 2016, mas ainda não tem filhos. Como
ele e os colegas em Mossoró, cerca de 1.400 médicos devem permanecer no
país por terem se casado, segundo a Organização Panamericana de Saúde
(Opas).
Encaminhado para Mossoró após fazer os cursos de procedimento médico
brasileiro e de Ligua Portuguesa, em Pernambuco, o cubano foi trabalhar
na Unidade Básica de Saúde do bairro Boa Vista. Alugou uma casa no mesmo
quarteirão do posto de saúde e cumpria jornada de oito horas diárias,
atendendo uma média de 40 pessoas diariamente.
Os vizinhos, pacientes e amigos do médico se reuniram na frente da casa
do médico, ao saberem que ele e seus colegas dariam entrevista, para
prestar solidariedade aos profissionais. "Eles (cubanos) têm uma forma
diferenciada de atender, abraçam o paciente, se dedicam à cura da
doença, é uma consulta humanizada. A visita em casa é como se fosse de
um parente", diz Talita Cavalcante, de 38 anos.
A autônoma Maria do Carmo Araújo Pereira fala que nunca tinha sido tão
bem atendida. Antes de dar um abraço no médico, a aposentada Maria
Antonia Hermenegilda falou que quer continuar o seu tratamento com o
Yoanis.
O médico afirma que quer ficar no país tanto pela esposa, como por
causa dos amigos que já fez. "Eu quero fazer o revalida, mas não posso
esperar tanto tempo sem trabalho. Eu tinha um contrato até 2020. Ninguém
está falando desses médicos que ficaram. Não tivemos uma resposta do
governo brasileiro para nós", considerou, afirmando que o processo de
revalidação dura mais de seis meses.
O médico Angel Leyva Rodriguez, que já tem um filho de dois anos no
país, afirma que está preocupado, porque não sabe como vai sustentar a
família.
"As pessoas querem que a gente fique. É um sinal que a gente está
fazendo um bom papel. Para mim, estamos sofrendo uma injustiça. Não
queriam ajudar a gente? Não disseram que a gente ia fazer o revalida?
Agora não tenho dinheiro de Cuba, nem o salário do governo do Brasil. A
gente quer ficar no programa pelo menos até o fim do contrato, em 2020.
Nós queremos revalidar", diz.
A médica Zuzel Rodriguez é outra que resolveu ficar em Mossoró. Formada
há 25 anos, deu aulas em universidades, formando novos médicos em Cuba.
No grupo, é a profissional de maior experiência: já trabalhou na
Venezuela e também na Guatemala, sempre na Saúde da Família.
Zuzel resolveu ficar na cidade porque conheceu e se casou com o
servidor público Josué Araújo de Oliveira, que conheceu logo que chegou
ao Rio Grande do Norte. Ele estava cedido à prefeitura e foi enviado
para buscar os médicos no aeroporto. O casal mora junto desde 2014 e se
casou oficialmente no ano passado. Ela já tem dois filhos adultos em
Cuba e viaja sempre que pode, para os visitar.
Uma quarta médica, Yailen Valdivia Fernandez, foi a Cuba para resolver
algumas questões, mas vai voltar ao Brasil, segundo os colegas.
Demora para revalidar
Para se ter uma ideia de como a revalidação pode demorar, o Revalida
2017 teve a primeira etapa realizada em setembro de 2017. O resultado do
gabarito oficial só foi divulgado em janeiro deste ano e a segunda
etapa era prevista para março. Porém, um alto grau de judicialização por parte de candidatos gerou um atraso de oito meses na aplicação dos testes. A segunda etapa aconteceu neste mês de novembro.
A prova é exigida para médicos brasileiros ou estrangeiros que queiram
atuar no Brasil e é promovida pelo Inep, que considerou que não foi
informado se haverá algum tipo de mudança para agilizar a revalidação
dos diplomas dos médicos cubanos.
De acordo com o Inep, o Revalida foi criado em 2011, em uma ação entre
os Ministérios da Educação e da Saúde. Antes do Exame, a revalidação era
restrita às instituições de ensino superior. "Como instrumento
unificado de avaliação, o Revalida tornou a revalidação mais acessível e
permitiu atender ao grande fluxo de graduados em escolas médicas no
exterior", diz o Inep.
O Exame é realizado anualmente e tem duas etapas:
- Avaliação Escrita - Composta de uma prova objetiva com 100 questões de múltipla escolha, com quatro alternativas de respostas, e uma prova discursiva, com cinco questões. Os participantes têm cinco horas para resolver a prova objetiva, pela manhã, e três horas para realizar a prova discursiva, no período da tarde.
- Avaliação de Habilidades Clínicas - O participante executa dez tarefas para uma banca examinar suas habilidades para o exercício da função médica. Para isso, o participante percorre dez estações resolvendo tarefas como: a investigação de história clínica, a interpretação de exames complementares, a formulação de hipóteses diagnósticas, a demonstração de procedimentos médicos, o aconselhamento a pacientes ou familiares.
Mais Médicos no RN
De acordo com assessoria de comunicação da Secretaria Estadual de Saúde
Pública, ao todo, 282 médicos estavam em atividade no RN através do
Programa Mais Médicos. Destes, 142 eram cubanos e atuavam em 67
municípios do RN.
Dos 72 médicos da Saúde da Família em Mossoró, 14 eram cubanos e
tiveram que parar de trabalhar semana passada. Segundo a Secretaria
Municipal de Saúde de Mossoró, 15.000 famílias eram atendidas pelos
profissionais cubanos. Atualmente, os outros médicos estão fazendo
rodízio para que as comunidades não fiquem desassistidas.
O Ministério da Saúde informou diz que os médicos cubanos podem
continuar no Programa Mais Médicos, desde que participem das seleções
que o Ministério da Saúde irá fazer permanentemente até ocupar as vagas
deixadas pelo fim da cooperação com a OPAS.
Entretanto, os editais priorizam médicos brasileiros com diplomas e
registros no país. Após essa seleção, as vagas restantes são destinadas a
brasileiros com registro fora do país e, só depois, para estrangeiros.
Os cubanos que moram no estado afirmam que dificilmente conseguirão
vagas dessa forma, já que as vagas já estão sendo preenchidas.
G1 RN.
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